A inflação é um tema recorrente cada vez que se fala da situação económica europeia, mas o que torna este tema particularmente actual é o facto de a inflação estar a níveis tão baixos que aumenta o risco de a Europa poder entrar rapidamente em deflação, tornando-se num novo “Japão” – que está nesta situação há mais de 24 anos.
Foi neste quadro que o BCE tomou medidas extraordinárias. Mas antes de entrarmos nestas mesmas medidas, há que explicar o porquê desta possível situação de deflação ser tão perigosa.
Em primeiro lugar, se a inflação atingir níveis demasiado baixos, torna mais difícil a redução da dívida por parte dos governos, empresas e famílias, um problema particular no Sul da Europa pelos enormes níveis de dívida contraída; esta situação não é somente limitada a esta zona, estando todos os países sujeitos a esta contingência.
Em segundo lugar, uma muito pequena inflação e sobretudo uma deflação dificulta o processo de recuperação da competitividade económica dos países da periferia em relação com a Alemanha. Em períodos de deflação, consumidores e empresas têm expectativas de que os preços baixem, levando-os a consumirem menos, o que leva ao enfraquecimento do crescimento da economia.
Foi com estes possíveis problemas em mente, que em Junho passado, o BCE anunciou medidas históricas para combater os baixos níveis de inflação. Começou por diminuir a taxa de juro directora para 0,15%. Diminuiu também as taxas de juro de depósito para -0,1% (fazendo com que os bancos paguem para depositar dinheiro nos cofres do BCE), tornando-se no primeiro banco central a baixar uma das suas principais taxas para níveis abaixo de zero. Por último, foi anunciado o programa “TLTRO”, que vai ter início neste mês de Setembro e que visa melhorar o crédito bancário do sector privado não financeiro da Zona Euro, através de uma linha de crédito de 400 mil milhões concedidos pelo BCE aos bancos comerciais a uma taxa de 0,25%, muito abaixo do preço de mercado.
No entanto, estas medidas não se revelaram suficientes, e em Agosto a inflação atingiu os 0,3%, um mínimo histórico desde 2009. Isto levou a que o BCE, mesmo antes do programa “TLTRO” entrar em vigor, anunciasse novas medidas no combate à baixa inflação. Entre estas medidas, está o lançamento dos programas de compras de activos do sector privado – de dívidas titularizadas (“Asset Backed Securities”) e hipotecárias (“Convertible Bonds”) – como também o corte adicional nas taxas de juro e de depósitos para 0,05% e -0,2%, respectivamente.
Resta agora saber se este novo programa de compra de activos – que tem como objectivo facilitar os fluxos de crédito para a economia – juntamente com o início do programa “TLTRO” e os cortes das principais taxas de juro serão suficientes para a inflação se aproximar do seu objectivo, estipulado pelo BCE, de 2%. Neste momento, o grande risco é de que estas medidas demorem a ser implementadas, principalmente no caso da compra de dívida titularizada, e que os seus efeitos demorem a ser “sentidos”, não evitando que a Zona Euro entre num perigoso período de deflação.
Ainda assim, Mario Draghi já garantiu que as medidas podem não ficar por aqui. O expectável é que o novo programa “ABSPP” (Programa de compras de “Asset Backed Securities” ou dívida titularizada), caso não resulte, se torne num programa total de alívio quantitativo (Quantitative Easing em inglês) – expansão monetária através da compra, em larga escala, de obrigações soberanas – já implementado anteriormente pelos Estados Unidos, Reino Unido e Japão.
Article published on September 16th, 2014 · Jornal de Negócios
Filipe Lopes · Nova Investment Club
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