IMG_1751O programa de Quantitative Easing (QE) de 1,1 biliões de euros conduzido pelo Banco Central Europeu (BCE) é um passo significante na tentativa de revitalizar a economia europeia. Contudo, quão eficiente será este programa e qual o seu verdadeiro impacto na economia europeia?

O programa de QE, que consiste na aquisição tanto de dívida privada como pública, é essencialmente semelhante aos programas conduzidos pelos Estados Unidos e Japão, em que os bancos centrais perspectivam que estas transacções reduzem as taxas de juro de longo prazo e conferem mais liquidez a activos de maior risco.

O QE americano foi decomposto em duas fases. Apesar da segunda fase ter apenas acrescentado 0,13 pontos percentuais à taxa anual de crescimento económico em 2010, a primeira conseguiu ter um impacto bastante mais significativo, uma vez que ocorreu em simultâneo com a redução das taxas de juro por parte da Reserva Federal americana. Contudo na Europa as taxas de juro encontram-se já nos seus níveis historicamente mais baixos, com “yields” de divida pública já em terreno negativo para certos países, o que poderá reduzir a eficácia do programa europeu quando comparado com o americano.

 Outra diferença importante entre ambos é que as empresas americanas recorrem mais a financiamento através de mercados obrigacionistas, ao passo que as europeias o fazem maioritariamente através de crédito bancário. Assim sendo, espera-se que o impacto do programa seja maior no caso americano, pois se a compra de dívida por parte do BCE não for acompanhada por um aumento da pressão regulamentar no sentido de forçar os bancos a fornecerem liquidez a empresas do sector privado, o QE poderá não se traduzir necessariamente no aumento desejável do investimento privado.

O presidente do Banco Central Europeu Mario Draghi afirmou que os activos comprados por parte de instituições europeias que possam incorrer em perdas, irão ser contidos no país de origem. A Zona Euro como um todo irá apenas absorver 20% do “risco partilhado”. Já a Reserva Federal americana assegura a partilha da totalidade de eventuais perdas registadas pelas diferentes divisões estatais do banco central. Ainda que isto possa ser visto como algo irrelevante, poderá enfraquecer o efeito do QE em casos de incumprimentos. Efectivamente, se um banco central estiver demasiado exposto a potenciais perdas, o efeito de liquidez almejado com o QE seria erradicado por um incumprimento.

Um dos principais argumentos a favor do QE é o aumento do preço dos activos e a geração de maior riqueza que será transferida para a economia real. Desde o início do QE nos EUA, o S&P500 valorizou mais de 120%. Embora seja discutível que preços dos activos mais altos se repercutem na economia real, há uma diferença comportamental importante entre o investidor americano e o europeu: os americanos culturalmente têm uma maior exposição ao mercado accionista, o que faz com que os efeitos do QE sejam mais visíveis.

O programa poderá por isso não ser tão eficaz como nos EUA e, sem medidas complementares, ficar aquém do impacto positivo desejado para o crescimento económico europeu, até agora moroso devido aos elevados níveis de endividamento de vários países e à falta de competitividade empresarial. O QE é por isso uma estratégia de último recurso que, na minha opinião, deveria ser utilizada conjuntamente com outras medidas de modo a acelerar o crescimento da economia.

Os membros do Eurogrupo podiam, por exemplo, modificar a regulamentação fiscal para estimular maiores investimentos corporativos, construção e consumo, sem terem por isso de aumentar os seus “deficits” fiscais e sem necessitarem de autorização por parte da Comissão Europeia.

Na minha opinião o QE europeu dificilmente terá um impacto tão visível como o americano e poderá não ser suficiente para combater a deflação. Fundamentalmente, o QE é como a ignição de um automóvel, que sem um motor operacional não irá a lado nenhum…

Article published on March 23rd, 2015 · Jornal de Negócios

Tiago Fontes Pereira de Mello

 


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