Não gosta da ideia de esperar pela sua vez na fila de uma repartição das Finanças? Há sempre a possibilidade de pagar a alguém para lhe guardar o lugar.
Ser taxista usando o seu carro. Ou alugá-lo apenas. Mostrar os seus dotes culinários e hospitalidade e partilhar experiências. Optimizar o espaço da sua casa, arrendando divisões disponíveis. Trocar as coisas a que não dá utilidade por outras que lhe façam falta. Poupar tempo nas tarefas do quotidiano.
Na verdade, algumas destas ideias são tudo menos inovadoras. Quem nunca preparou um jantar para amigos, ou forneceu uma boleia num momento de necessidade? Mas a expansão destas práticas a pessoas desconhecidas pode ser vista como algo desconcertante, por exemplo, o leitor seria capaz de alugar o seu carro por um dia a um desconhecido? Pelos vistos, há quem diga que sim, este que é um dos muitos exemplos de um novo paradigma económico que tem ganho grande dimensão recentemente. A dimensão e importância já lhe valeram um termo próprio: “sharing economy”.
O suporte central deste modelo económico é, tal como o estrangeirismo sugere, a partilha. Parte-se da realidade que todos possuímos activos que não usamos no pleno das suas capacidades e que há outras pessoas que estão interessadas a usá-los. O exemplo do carro talvez seja o mais ilustrativo: a compra de um carro corresponde a um investimento considerável. No entanto, de acordo com o professor Arun Sundararajan (docente na NYU e investigador na área de “sharing economy”), só usamos o nosso carro 8% do tempo da sua vida útil. Se pensarmos nesta taxa de utilização pessoal e aliarmos a existência de alternativas de transporte nos meios urbanos (onde regra geral a maioria da população vive), talvez grande parte das pessoas só precisará de transporte privado esporadicamente. Nesse caso, o aluguer de um carro parece ser a opção economicamente mais viável.
Duas alternativas surgem: um serviço de aluguer convencional, ou alugar a um particular directamente, através do site RelayRides, por exemplo. Ainda que um serviço convencional deva garantir uma melhor qualidade do veículo, um particular tem uma vantagem competitiva em termos de preço, pois não tem tantos custos associados a um aluguer como uma empresa que se dedica a essa actividade. Mas a questão impera, o risco de disponibilizar algo valioso a um desconhecido é compensado pelo pagamento?
Este tipo de transacções de pessoa para pessoa dá-se em plataformas digitais específicas ao tipo de activo que é procurado. A principal geografia onde estas plataformas estão presentes é os Estados Unidos, embora por cá nomes como Uber e Airbnb já sejam identificáveis. O sistema funciona de maneira a que todos os envolvidos, os prestadores de serviços e os clientes, sejam avaliados pela experiência que proporcionam ao outro. E uma das características mais citadas como atractividade deste tipo de serviço é conhecer novas pessoas, que faz com que a transacção seja mais do que uma mera prestação de serviços. Assim, por força das avaliações, apenas quem historicamente tem mostrado uma boa prestação na relação é considerado para continuar a usufruir da plataforma da melhor maneira. O que assegura a confiança necessária para avançar com a partilha.
A “sharing economy” oferece a possibilidade de criarmos um “negócio próprio” (como ser um condutor da Uber com o nosso carro), onde a flexibilidade é a palavra de ordem e abre uma fonte de rendimento temporário ou part-time para os prestadores de serviços, enquanto se cria valor para os consumidores via expansão da oferta, possibilidade de preços mais acessíveis e simplicidade no acesso a diversos serviços. As empresas já estabelecidas que agora se vêm ameaçadas por este novo modelo recorrem aos tribunais para atrasar a proliferação desta corrente, sendo em Portugal a batalha taxistas contra Uber o caso mais mediático. No campo dos arrendamentos, a Airbnb também enfrenta grandes entraves, mais significativamente em Nova Iorque, onde arrendar um quarto por menos de 30 dias é muito restrito, fazendo com que a maioria dos serviços disponibilizados pela empresa sejam considerados ilegais.
Porém, o sucesso destas empresas comunitárias indica que há valor a ser criado para a sociedade com a sua actividade. E como a lei existe para servir a sociedade e não o oposto, será apenas uma questão de tempo até que as devidas alterações sejam feitas e as empresas tradicionais terão de saber adaptar-se à nova concorrência.
Article published on June 15h, 2015 · Jornal de Negócios
Pedro Fragoso
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